domingo, 6 de junho de 2010

O quase fim de um piloto apaixonado

Levantei esta manhã mais feliz que os outros dias, era um voo muito importante, iria levar artistas muito conhecidos. Assim que tomei o café, minha noive me perguntou se eu tinha certeza que iria, pois estava com um aperto no coração. Pedi para que ela ficasse tranquila e para acalmá-la levei-a ao aeroporto comigo, mas ela segurava meu braço com tanta força, não queria que eu partisse. Como eu poderia recusar este voo. Estávamos precisando de dinheiro para o noivado.
Escutei a moça dizendo, “última chamada para o voo com origem Rio de Janeiro e destino a Madri”. Já estava na hora de ir. Subi as escadas com os passageiros e fiz questão de conferir se todos estavam bem acomodados. E sim, estavam, então poderíamos partir.
Liguei logo toda aquela engrenagem e já fui rezando um pai-nosso. Quanto estávamos no ar, senti um alívio, mas não sabia que seria tão passageiro. Passando uns quinze minutos, recebi uma notícia por rádio de que o tempo estava bastante chuvoso, aquilo me deixou um tanto quanto preocupado. Mas tive que me manter paciente, será que deveríamos ter avisado os passageiros? Não queria preocupá-los pois sabia que todos eles tinham compromissos decisivos em suas vidas. Resolvi não dizer nada pelo menos naquele momento.
Achei que fosse um pouco de exagero, mas não, a tempestade chegou a nós e estava realmente muito forte. Tive que assumir os controles com uma força que nunca imaginava que tivesse. Deixei o avião em piloto automático por uns instantes e fui avisar aos passageiros para que se apresassem em pegar pára-quedas, pois a situação estava complicada. Assim que voltei, vi uma peça importante voando pelos ares. Assumi os controles, mas já não tinha mais jeito, o avião iria cair.
O teto se rancou e eu me abracei a hélice esperando a minha hora chegar. Caí em cima de um barco que estava passando logo na hora e fiquei vendo a triste cena: sangue espalhado no ar; o violinista empalidecido caindo com seu estradivárius junto com as mãos e pernas das dançarinas; a nadadora belíssima parecia estar em seu último salto; as meninas caíram rápidas ainda como se dançassem; a louca abraçada ao ramalhete que pensou ser o pára-quedas; a prima-dona já vestida iluminando o céu com sua longa cauda de douradas lantejoulas; a moça-adormecida ainda vem dormindo; o paralítico vai decaindo e suas pernas ganhando movimento e por últimos o poeta míope que deve estar vendo tudo isso como uma linda poesia.
Depois de observar a cena, arregalo os olhos e me vejo rodeado de médicos, que me prestam socorros e assim posso voltar aos braços de minha amada.
Assim que cheguei ao aeroporto minha noiva correu e me abraçou forte, eu ainda não muito recuperado tentei dizer algumas palavras, mas não conseguia. Ela me disse que acompanhou tudo pela TV e que era uma bênção eu ainda estar vivo.
Pude voltar para casa bem, depois daquela horrível experiência, e minhas expressões de alegria nunca foram mais as mesmas.

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